O que podemos aprender com o mercado de café?

*Kenya B. Siqueira

Você já ouviu falar sobre as Ondas de Consumo do Café? Cada período da história do consumo do café é chamado de onda. São momentos históricos ou fases que mostram a evolução do consumo da bebida no Brasil e no mundo.

A primeira onda marca a popularização do consumo de café, com muitas marcas disponíveis nas prateleiras dos supermercados. Neste período, o café era apenas uma commodity.

A segunda onda surgiu com as cafeterias e os cafés espressos, que eram mais intensos, mas sem a preocupação com a qualidade do grão. Nesse período, consumir café espresso era sinônimo de glamour. Além disso, outras misturas começaram a ser apresentadas ao consumidor: café com leite, cappuccino, etc.

Já a terceira onda remete a uma experiência sensorial. O café começou a ser degustado, assim como o vinho. Com isso, a rastreabilidade, denominação de origem e qualidade dos grãos ganhou relevância. Ou seja, o protagonista passou a ser o grão de café.

Estudiosos já falam na quarta onda do café, quando os cafés gourmet e especiais podem ser encontrados nas gôndolas dos supermercados. As pessoas já têm mais conhecimento sobre o processo de produção e origem dos grãos e até fazem a própria torrefação em casa.

Portanto, pode-se observar que o mercado de café já é bem evoluído, passando por 4 ondas de consumo. Mas, e o mercado do leite? Em que onda de consumo se encontra?

Analisando o consumo de leite no Brasil ao longo dos anos, observa-se um incremento expressivo. Entre 2000 e 2013, o consumo per capita de leite e derivados cresceu 41%. Se considerarmos um período mais distante, como 1980, o aumento foi mais significativo: 74%. Nesse período, o número de marcas de leite longa vida (derivado lácteo mais consumido) se multiplicaram nos supermercados, fazendo com que o produto se tornasse praticamente uma commodity. Isso, se parece muito com a primeira onda de consumo do café.

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No entanto, o mercado lácteo parece não ter tido uma segunda onda semelhante a do café, mesmo porque o setor não tem nada similar às cafeterias para trazer o glamour ao consumo de leite e derivados. Em termos de restaurantes ou franquias específicas para o consumo de lácteos, existem as sorveterias e queijarias. Algumas até com muito requinte e glamour. Na verdade, existem também algumas iniciativas isoladas, como o The Loft Restaurant at the Traderspoint Creamery, em Indiana, nos Estados Unidos, cujos lácteos são a atração principal do menu.

Porém, dentro do mercado de leite e derivados, está mais nítido um movimento semelhante à terceira onda do café, em que as vacas se tornam mais protagonistas. Impulsionado pela pressão do consumidor, pode-se observar nos últimos tempos, uma preocupação maior com a rastreabilidade dos derivados lácteos, com a denominação de origem, no caso dos queijos, entre outros fatores. A experiência sensorial e emocional também tem se sobressaído recentemente, com lançamentos de produtos com embalagens mais atraentes, que remetem a saudabilidade, ou regionalismo, ou conveniência. Conhecer a história por trás do produto consumido, já é uma demanda dos amantes dos lácteos.

Com isso, o slogan “Da semente à xícara” usado no mercado cafeeiro, pode ser transformado para “Da vaca ao copo de leite”. No entanto, vale ressaltar que ainda estamos no início dessa onda de consumo do leite. O mercado ainda não atingiu um nível de maturação. Mas, já se observam mudanças de comportamento, no sentido de consumo de produtos mais gourmet, mais especiais. Neste caso, os produtos especiais podem ser com mais nutrientes, com mais história, com mais praticidade, com mais excentricidade. Enfim, com algum valor agregado que faça o consumidor querer degustar esse derivado lácteo, como se degusta um bom café ou um bom vinho.

*Kenya B. Siqueira

Engenheira de alimentos, doutora em Economia Aplicada, pesquisadora da Embrapa.

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