Pesquisas realizadas no RS (Fischer & Zanella e colaboradores) vêm comprovando que a subnutrição da vaca leiteira não só diminui drasticamente a quantidade de leite produzido mas também altera sua composição, com prejuízo de qualidade.
Isso até era esperado, mas carecia-se de dados mais detalhados e levantados cientificamente. Essa subnutrição é mais manifesta nos períodos de escassez de pastagem, no chamado “vazio outonal” e também no verão, quando o produtor do RS, também lavoureiro,
se dedica mais às culturas do período.
Como conseqüência, segundo as pesquisas, a subnutrição da vaca, de certo modo, pode até afetar a relação do produtor com a indústria. Acontece que a subnutrição resulta na alteração da composição normal do leite (queda dos teores de caseína, lactose, minerais, extrato seco, etc.) e de outras características químicas (aumento do cálcio iônico, uréia) e físicas(crioscopia,densidade).
Por outro lado, para produtos como o leite “longa vida” a indústria valoriza a estabilidade térmica da matéria-prima e isto é testado a campo, de modo equivocado, com a prova do álcool (alizarol), que também serve para medir a acidez do leite. Daí que surge o problema, pois o
leite da vaca subnutrida é mais sensível ao álcool e reage como se fosse “ácido”, sendo então condenado pela indústria.
É o que os pesquisadores denominaram de “LINA”, leite instável (ao álcool) não ácido.
Portanto, em tais casos, o teste de estabilidade térmica feito através da prova do álcool não
é um procedimento adequado. Segundo as mesmas pesquisas, em determinada cooperativa onde foram coletadas 2396 amostras de leite durante um ano, o problema foi constatado em 55 % das análises.
Entretanto, mesmo que tal teste do álcool venha a ser substituído por outro, o fato de a vaca estar numa situação de subnutrição continuará persistindo, e não por falta de tecnologia, pois
o conhecimento adquirido com décadas de pesquisa permite hoje o cálculo correto de
qualquer dieta. O que falta é o fornecimento adequado de alimentos para o gado leiteiro nas diferentes fases produtivas e principalmente durante a lactação, buscando otimizar a produção
e mantendo a saúde e a capacidade reprodutiva do animal.
Todavia, na prática, constata-se muito empirismo no tocante à alimentação do gado leiteiro,
sofrendo especialmente a vaca em lactação as consequências mais graves. E a situação pode, em certos casos, até se agravar com o uso de sêmen de touros cada vez mais “melhoradores”, de crescente mérito genético para aumento da produção de leite de suas crias, o que não deixa de ser um contra-senso.
Acontece que, em muitos casos, o avanço genético para o aumento da secreção de leite no úbere da vaca leiteira não vem sendo acompanhado pelo melhoramento concomitante da alimentação. Isto se torna mais crítico especialmente no início da lactação, pois para o organismo de uma fêmea lactante a cria tem toda prioridade, ou seja, se uma vaca foi “melhorada” geneticamente para produzir 40 litros ao dia, o metabolismo do animal direciona-se
prioritariamente para essa demanda, por força da natureza.
Em outras palavras,o organismo do animal procura trabalhar para que a “cria” receba seus 40 litros
diários de leite! Assim, mesmo estando mal alimentada, a vaca de bom potencial
genético leiteiro tenta realizar aquilo para o qual foi “programada”, porém sem consegui-lo e às custas de sua saúde: perdendo peso e condição corporal, padecendo de distúrbios digestivos e metabólicos e anulando a sua capacidade reprodutiva.
É obvio que a sustentabilidade desse tipo de “exploração” fica comprometida e a condição corporal da vaca torna-se a de um animal famélico e há produtor de leite que acredita que tal condição corporal seja algo ainda “normal”.
Por outro lado, a margem estreita da atividade leiteira, onde a alimentação representa 50 % do
custo de produção, e a propalada “vocação” do Brasil para a produção preponderantemente “a
pasto” (sem considerar a “genética” de cada rebanho e o efeito do clima sobre a disponibilidade de forragem) e a alegação de que tal sistema permite a diminuição do custo operacional de produção (sem considerar o efeito sobre o custo total) são “meias verdades” que quando levianamente generalizadas agravam ainda mais a situação.
Afora tudo isso, há que se considerar ainda o aspecto ético. Será que o consumidor mais bem
informado aceitaria um produto proveniente de um animal faminto?
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