A IN76 e IN77 do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) entrou em vigor no dia 30 de maio de 2019 e, entre as regras dispostas no documento, a que tem mais preocupado os produtores no atual momento diz respeito à interrupção da coleta do leite daqueles que não atenderem aos requisitos mínimos para a Contagem Padrão em Placas (CPP), também conhecida por Contagem Bacteriana Total (CBT).
De acordo com o artigo 7º da IN 76, o leite cru refrigerado de tanque individual ou de uso comunitário deve apresentar médias geométricas trimestrais de CPP de no máximo 300.000 UFC/mL (trezentas mil unidades formadoras de colônia por mililitro). As médias geométricas devem considerar as análises realizadas no período de três meses consecutivos e ininterruptos com no mínimo uma amostra mensal de cada tanque. As três primeiras médias geométricas trimestrais consecutivas, que serão consideradas para efeito de interrupção da coleta do leite, serão referentes aos meses de agosto, setembro e outubro de 2019.
Para o cálculo da primeira média geométrica trimestral, o produtor deve levar em conta os resultados das análises oficiais dos meses de junho, julho e agosto de 2019. Dessa forma, em agosto o produtor terá formado a primeira média geométrica trimestral referente à qualidade microbiológica do seu leite. A coleta do leite pelo laticínio permanece inalterada nesse mês, independente do resultado obtido. Porém, se o resultado estiver acima do limite máximo definido pela legislação, medidas de correção deverão ser tomadas rapidamente para que o valor da CPP retorne a níveis satisfatórios o quanto antes e, assim, não comprometa o resultado da próxima análise que será realizada em setembro. A segunda média geométrica trimestral será formada pelos resultados dos meses de julho, agosto e setembro de 2019. Por fim, a terceira e última média geométrica trimestral será formada pelos meses de agosto, setembro e outubro de 2019.
Conforme disposto no Artigo 45º da IN 77, o estabelecimento deve interromper a coleta do leite na propriedade que apresentar, por três meses consecutivos, resultado de média geométrica fora do padrão estabelecido em Regulamento Técnico de Identidade e Qualidade do leite cru refrigerado para Contagem Padrão em Placas - CPP. Portanto, a decisão de interromper a coleta do leite por parte do laticínio em função do não atendimento aos requisitos microbiológicos da IN 77 somente ocorrerá a partir de outubro de 2019, quando cada produtor terá formado uma sequência de três médias geométricas trimestrais.
Veja abaixo alguns exemplos para melhor entendimento:
Exemplo 1: Em agosto, a primeira média geométrica trimestral (formada pelos resultados oficiais dos meses de junho, julho e agosto) foi de 342.000 UFC/mL (fora do padrão), porém, a coleta do leite não é interrompida nesse momento. Com o resultado mensal de setembro, a segunda média geométrica trimestral diminuiu para 267.000 UFC/mL e, em outubro esse valor ficou em 150.000 UFC/mL. Nesse caso, o leite desse produtor não terá a sua coleta interrompida pelo laticínio. Com a manutenção de resultados mensais subsequentes satisfatórios, as médias geométricas trimestrais permanecem sempre abaixo do limite máximo permitido na legislação, evitando a interrupção da coleta do leite pelo laticínio. Nesse exemplo, a significativa diminuição da contagem bacteriana total do leite no mês de agosto e a partir de outubro, provavelmente em função da adoção de boas práticas de ordenha e higiene na produção, foi fundamental para a manutenção de valores abaixo do limite máximo permitido pela legislação.
Exemplo 2: Em agosto, a primeira média geométrica trimestral (formada pelos resultados oficiais dos meses de junho, julho e agosto) foi de 881.000 UFC/mL (fora do padrão), porém, a coleta do leite também não é interrompida nesse momento. Com o resultado mensal de setembro muito alto, a segunda média geométrica também permanece muito alta (803.000 UFC/mL) e, em outubro esse valor ficou em 420.000 UFC/mL. Apesar da melhora do resultado mensal em outubro (147.000 UFC/mL), esse resultado não foi suficiente para diminuir a média geométrica trimestral que leva em conta no cálculo os resultados dos dois meses anteriores (agosto e setembro). Nesse caso, o leite desse produtor terá a sua coleta interrompida pelo laticínio já no mês de outubro.
No parágrafo único do artigo 45º da IN 77, o documento dispõe sobre o restabelecimento da coleta do leite: “Para restabelecimento da coleta do leite, deve ser identificada a causa do desvio, adotadas as ações corretivas e apresentado 1 (um) resultado de análise de Contagem Padrão em Placas - CPP - dentro do padrão, emitido por laboratório da RBQL”. É importante observar nesse exemplo 2 que, provavelmente, se o produtor apresentar um resultado satisfatório ainda no mês de outubro, retomará rapidamente a entrega do leite e, ainda, mantendo as ações corretivas e as boas práticas de ordenha e higiene na produção ao longo dos meses subsequentes (novembro, dezembro, etc.), obterá resultados mensais e médias geométricas trimestrais dentro dos limites aceitáveis pela legislação, evitando a interrupção da coleta do leite pelo laticínio.
Uma vez entendido como funcionará a normativa ministerial, produtores e laticínios deverão focar no treinamento e capacitação dos seus funcionários.
Produtores devem focar na capacitação do ordenhador, enquanto os laticínios devem priorizar o treinamento dos seus técnicos sobre os principais procedimentos que podem afetar negativamente a qualidade microbiológica do leite na fazenda.
Os fatores associados à alta CBT estão relacionados principalmente à não adoção das boas práticas agropecuárias; à precária limpeza e higiene do ambiente das vacas, do equipamento de ordenha e tanque de refrigeração; à não adoção de hábitos higiênicos do ordenhador e, à qualidade da água utilizada na produção e, ao maior tempo para diminuição da temperatura do leite após a ordenha.
O ordenhador tem um papel muito importante na rotina da fazenda, mas muitas vezes sem a capacitação necessária, passa a desempenhar suas atividades de forma ineficaz. O processo de ordenha depende da interação harmoniosa entre a vaca, o equipamento de ordenha e o ordenhador. A escolha do ordenhador dependerá do seu perfil, habilidades e vontade para realizar essa atividade. O treinamento é muito importante, porém a ordenha só será eficiente se o ordenhador atender a alguns pré-requisitos, como: gostar de vacas e interagir com elas de forma natural, cuidadosa e tranquila; gostar de ordenhar e ter ciência da importância do seu trabalho, seguir procedimentos padronizados de ordenha e possuir hábitos higiênicos.
A água pode ser uma fonte importante de contaminação microbiana. A água utilizada na produção deve ser de boa qualidade bacteriológica. Caixas de abastecimento de água não tratadas ou de fontes naturais como poços perfurados, tanques e rios, também podem estar contaminados com microrganismos fecais. Além disso, uma grande variedade de bactérias saprófitas também podem estar presentes na água e podem contaminar o leite.
A limpeza do equipamento e do tanque deve seguir sempre o protocolo indicado pelos fabricantes, utilizando produtos registrados no MAPA ou ANVISA e próprios para essa finalidade. O produtor deve sempre seguir a recomendação de dosagem do fabricante, assim como as recomendações de tempo e temperatura de cada ciclo para minimizar os riscos relativos às falhas na limpeza dos equipamentos, que acarretam: aumento da contaminação bacteriana e podem ocasionar a presença de resíduos químicos para o leite.
Tanques de refrigeração bem dimensionados à capacidade produtiva da fazenda permitem que o leite seja refrigerado à 4°C em até 3 horas após a ordenha, diminuindo significativamente o crescimento bacteriano durante o período de armazenamento. Portanto, um bom dimensionamento do tanque ajustado ao volume de produção da propriedade faz parte do planejamento da atividade.
Para maiores informações sobre os bons hábitos de um ordenhador, procedimentos padrão de rotina de ordenha, limpeza dos equipamentos de ordenha e tanque de refrigeração, e refrigeração adequada do leite, acesse os links abaixo:
Manejo de ordenha mecânica:
https://ainfo.cnptia.embrapa.br/digital/bitstream/item/89985/1/COT-72-Manejo-de-Ordenha-Mecanica.pdf
Higienização do tanque de refrigeração:
https://www.infoteca.cnptia.embrapa.br/infoteca/bitstream/doc/930349/1/COT65HigienizacaodotanquederefrigeracaoLeticiaMendoncan65.pdf
Refrigeração adequada do leite:
https://ainfo.cnptia.embrapa.br/digital/bitstream/item/89854/1/COT-69-Refrigeracao-adequada-do-leite.pdf
Hábitos do ordenhador:
https://ainfo.cnptia.embrapa.br/digital/bitstream/item/89983/1/COT-70-Os-Bons-Habitos-do-Ordenhador-Competente-Leticia-Mendonca-n-70.pdf
Manejo de ordenha manual:
https://ainfo.cnptia.embrapa.br/digital/bitstream/item/89984/1/COT-71-Manejo-de-Ordenha-Manual.pdf
Higienização do equipamento de ordenha mecânica:
https://www.infoteca.cnptia.embrapa.br/infoteca/bitstream/doc/930341/1/COT64HigienizacaodoequipamentodeordenhamecanicaLeticiaMendoncan64.pdf
Cláudio Antonio Versiani Paiva
Médico Veterinário – Dsc. Ciência Animal
Analista da Embrapa Gado de Leite